segunda-feira, 12 de setembro de 2016

CONSCRITO 307

HOMEM DE FERRO : VÍRUS 

6


Há um homem chamado Happy Hogan. Ele é leal e forte. A partir dele, eu criei
vocês, e vocês também são leais e fortes. Mas são ainda mais leais, e mais fortes, do
que Happy Hogan. Por quê? Porque a lealdade dele é devotada a um vagabundo
prolixo, um pretenso plutocrata cujo coração falha e cujo poder reside numa
armadura de brinquedo. Sua lealdade vocês oferecem a Zola, e à Hidra! Vocês são
as cem cabeças da nova Hidra. Happy Hogan, o modelo inferior usado em sua
magnífica criação, é um soldado. Vocês também são soldados, mas lutam por uma
causa mais gloriosa, não pela glória doentia e gratificação de Tony Stark. Falo
dentro de suas mentes, e os fortaleço. Torno-os mais resolutos. E mais
incomodados com a sujeira abundante do mundo no qual somos todos forçados a
viver… e, graças à minha voz, que lhes dou igualmente, serão capazes de ouvir
falar de um mundo melhor. Um mundo pelo qual podem lutar. Um mundo no qual
poderei falar para as mentes de todos os homens, mulheres e crianças! Um mundo
no qual seguiremos todos na mesma direção, com os mesmos objetivos e a mesma
visão! Um mundo no qual todos serão Hidra!
Três dias após o encontro anticlimático com Serena Borland, Tony ainda estava
no Laboratório de ITR. Ele tirou os olhos de um molde de injeção de nanotubos de
carbono e viu Pepper ali parada.
– É aquele troço invisível, Pep. É daqui que vai sair a próxima inovação. Tudo
isso, os raios e a levitação, posso melhorar tudo. Mas é aqui no microscópico, é
aqui que posso transformar as coisas. É isso que preciso fazer.
– O que precisa fazer é tomar um banho e ligar pro Rhodey – disse Pepper.
Ocorreu a Tony que ele dormira apenas 8 das últimas 72 horas, e que não
voltara ao escritório desde que saíra voando da garagem, enquanto Happy
esperava abrir o primeiro semáforo do trajeto ao apartamento de Serena. Sentiase confuso, mas acelerado pelo trabalho que concluíra. O laboratório. Era ali que
se sentia mais confortável. Não precisava encenar para as máquinas, não tinha
que lhes fazer pose e sorrir. Elas não ligavam para as entregas da última rodada
de contratos de aquisição com o governo nem para os dividendos das ações
preferenciais das Indústrias Stark.
Sentira-se mais contente – pura e simplesmente contente – durante as 72
horas anteriores do que em anos.
Pepper ficou parada, esperando uma resposta. Tony quis que ela fosse
embora. Mas era um adulto, diretor-presidente de uma das maiores firmas de P &
D do mundo. Relutantemente, começou a reassumir a
persona de Tony Stark.
– Só se o Rhodey tomar um banho também. Certo, Pep. Me dê uma hora.
Imagino que você já marcou a reunião.
– Daqui a uma hora e meia.
– Boa garota.
Tony já estava a caminho do chuveiro, mas sua mente continuava elaborando
diagnósticos, imersa em histogramas de transferência de energia e propagação de
resposta em nanoescala.


Pepper saiu para o estacionamento, onde estava Rhodey, encostado no parachoque de seu Taurus preto oficial.
– Estou preocupada com ele – ela disse.
– Pelo visto, todos nós deveríamos estar.
– Não pode contar pro Nick, Rhodey. Ele precisa terminar esse trabalho, e se
o Fury ficar sabendo, você sabe como ele é. Vai chegar aqui furioso, querendo que
o Tony desligue tudo até que cumpra todos os contratos federais. Vai dar tudo
errado.
Rhodey olhou para o céu, na direção do aeroporto de Islip.
– Sabia que Madame Hidra estava naquele avião? Estava viajando
disfarçada. Aparentemente, encheu tanto o saco que uma das comissárias
reclamou para o piloto pouco antes de decolarem. Está tudo na caixa preta.
– Não espera que eu chore pela Madame Hidra, né?
– Não. Não espero isso de ninguém. Mas estou contando porque alguém foi
responsável por isso. Ainda não sabemos, ao certo, quem. Mas foi um ataque, com
certeza. Alguém derrubou aquele avião porque ela estava nele. Duas horas após
o acidente, um dos funcionários da companhia aérea foi baleado no
estacionamento. O cara que o matou suicidou-se em seguida. Ainda estamos
procurando pistas pra saber se eles se conheciam, mas sabe o que eu acho? Acho
que alguém estava aparando arestas.
Pepper percorreu o que lhe fora dito, revendo para ter certeza de que
assimilara todas as implicações.
– Aparando arestas – ela repetiu. – Fazendo o assassino se matar? Isso
demanda muita lavagem cerebral.
– Se for lavagem cerebral. Escute, eu sei que você só veio aqui pra ganhar
tempo pro Tony. Deixei rolar um pouquinho. Agora que tal pararmos de brincar e
eu ir lá falar com ele?

– Ele está no chuveiro. Bom, espero que esteja. – Após uma pausa,
acrescentou: – Estou preocupada com ele.
– Já disse isso um minuto atrás.
– Bom, e não mudei de ideia, Rhodey – ela ralhou. – Ele está com essa ideia
de controle imediato na cabeça, e não sabe falar de outra coisa. Às vezes acho
que ele vai usar isso pra não ter que lidar com as pessoas.
– O Tony? Não lidar com as pessoas? Quem é que vai massagear o ego dele,
então? – Rhodey abriu um sorriso.
– É esse o problema, mais ou menos. Acho que ele não tem mais tido aquela
injeção de ânimo quando as pessoas o idolatram. – Ela começou a dizer outra
coisa, mas parou e deu de ombros. – Pelo menos não anda bebendo.
– É, isso é uma coisa boa. Será que ele já terminou o banho?
Ela fez que sim.
– Creio que sim. Mas duvido que tenha saído do mundo da cabeça dele.
 


 No escritório situado ao lado do canto do Laboratório de ITR, Tony recebeu
Rhodey com um grande sorriso.
– Meu velho amigo, espere só até ver o que tenho feito. Tem tudo a ver com
interface. Quando você acerta na interface, é como ter um radar enquanto o
outro cara ainda está lendo miúdos de frango pra prever o clima. – Ele fez um
gesto convidando Rhodey a se sentar e lhe serviu uma xícara de café, sem
perguntar se ele queria. Então, você veio aqui me dizer que a S.H.I.E.L.D. anda
superpreocupada ou só pra fazer social?
– Você sabe muito bem por que eu vim – disse Rhodey. Deitou a xícara na
mesa ao lado.
Tony sentou-se à mesa e colocou uma expressão séria no rosto.
– Certo. Estou pronto pra tomar meu remédio.
– Brinque quanto quiser, mas tem sorte pelo Nick não estar aqui – disse
Rhodey. – Ele é o fim da linha. Você está violando todos os prazos de entrega
imagináveis, e pode ser o sr. Tony Stark das incríveis Indústrias Stark, mas isso
não significa grande coisa quando tem um monte de senadores querendo se
reeleger que assinaram um decreto de autorização de defesa e estão agora sendo
detonados na imprensa por terem gasto todo esse dinheiro sem ter nada de
tecnológico pra mostrar.

– Diga a todos que é confidencial – Tony disse, dando de ombros. – A maioria
é mesmo.
Rhodey balançou a cabeça.
– Não importa. O que importa é que a imprensa está começando a perguntar
o que você está fazendo com todo esse dinheiro. Logo o Congresso vai começar a
pegar no seu pé; já começou, na verdade, por baixo do pano.
– Deixa eles – disse Tony.
– Deixa eles? Não é Tony Stark quem disse isso. Você precisa pegar o touro
pelos chifres ou algo assim. Ir lá fora, dizer alguma coisa, produzir alguma coisa
que fique bem na TV. Exploda alguma coisa pra que eles possam voltar a se
preocupar com seguridade social.
Pepper apareceu à porta.
– Fury está no telefone.
– Você planejou isso? – Tony olhava para Rhodey. Depois passou para
Pepper. – Ou foi você? Ou isso é algum tipo de intervenção?
– Precisamos que nos dê alguma coisa, Tony. Você quer se dedicar um pouco
ao controle imediato, tudo bem, eu entendo. É uma tecnologia promissora. Mas
também tem responsabilidades para com as pessoas que financiaram este
laboratório.
– Eu financiei este laboratório. Eu.
– O que, com seus próprios recursos? De onde veio esse dinheiro?
– Não preciso de sermão sobre responsabilidade, Rhodey, e não preciso que
faça a minha contabilidade também. O que preciso é que me deixe em paz para
que eu volte ao trabalho.
– O fato é que, ultimamente, quando eu o deixo em paz, você não faz o
trabalho que devia estar fazendo. Você é uma pessoa pública, goste ou não.
Esqueça o Congresso; como você acha que o norte-americano comum se sente
quando de repente Tony Stark, gênio playboy, queridinho das câmeras, não sai do
laboratório? Fica esquisito. Não queremos que achem nada esquisito. E você pode
dar um jeito nisso.
Ele pegou o café e deu um gole, olhando para Tony por cima da borda da
caneca. Da porta, Pepper disse:
– Meninos. Aguardo instruções quanto ao que fazer com o impaciente líder da
S.H.I.E.L.D.
Rhodey e Tony mantiveram o olhar fixo um no outro por um longo momento.
Então Tony disse:

– Que tal você dizer ao Nick que Rhodey vai ligar pra ele daqui meia hora? –
Pepper desapareceu, e Tony se levantou. – Beleza, Rhodey. Deixa eu mostrar o
que estou fazendo. Depois você pode voltar e contar pro Fury, pra ele se sentir
melhor.
 

 O protótipo da nova armadura estava suspenso num quadro perto da mesa de
controle principal.
– Ainda estou trabalhando em alguns detalhes da interface – Tony explicou,
enquanto apresentava a Rhodey as inovações recentes. – Mas tenho conseguido
tempos de resposta quase nulos, o que acredito ser possível com a interface que
posso construir. Além disso, tem uns brinquedos novos muito legais na armadura;
um deles – acrescentou, dando uma piscadinha – tem um pouco da tecnologia de
controle de massas por som de baixa frequência que talvez seja parte de um
contrato governamental. Lembre-se de comentar isso com o Fury.
Ele se moveu na direção das três armaduras mais velhas, que permaneciam
enfileiradas na extremidade mais distante.
– Consertei algumas partes, e qualquer uma delas seria útil se necessário.
Também diga a Fury para não ficar noites sem dormir, com medo de que o fim do
mundo esteja próximo e eu tenha de encontrar o apocalipse em um protótipo.
Rhodey parou ao lado de um dos protótipos.
– Parece legal.
Pareciam ser legais mesmo, se era isso que Tony dizia. Ele criara um tecido de
dupla camada de nanotubos de carbono prensadas feito sanduíche com um gel que
absorvia choque no recheio, capaz de dispersar a energia cinética gerada por
qualquer coisa menor que um míssil. Estava desenvolvendo um sistema
supercondutor de controle e interface que crescia dentro de cada tubo individual,
criando, essencialmente, um sistema nervoso dentro da armadura. Interfaces
dérmicas a dirigiriam com impulsos do cérebro dele, com tempos de resposta
iguais – ou às vezes menores – ao tempo que os mesmos impulsos levavam para
gerar resposta nos próprios músculos de Tony.
– Na última vez em que tentei isso, quando liguei a armadura internamente
ao meu sistema nervoso, não contei com os efeitos colaterais. O grande lance
agora é que fiz ao contrário e construí um sistema nervoso para a armadura.
Assim que tiver praticado um pouco, ela vai se mover junto comigo. Não vou

precisar de mecanismos, nem dos delays que acompanham. Vai ser quase
senciente.
– Senciente, é? – disse Rhodey. – Parece-me que isso não deu muito certo no
passado.
– Escolhi mal os termos. O software de comando e controle acoplado nela vai
atuar como um sistema nervoso em vez de um conjunto de subcomandos. Tem
toda uma qualidade integrada à coisa que passaria até por uma espécie de teste
de Turing de estímulo-resposta. Se houvesse algo assim.
Ele olhou para Rhodey, e apenas por um momento este viu o antigo Tony. A
fanfarronice e o prazer quase infantil gerado por uma tecnologia nova. Sentiu-se
melhor.
Todo muito passa por fases ruins, ele pensou. Talvez Tony estivesse
finalmente saindo de uma.
– Que tal eu ligar pra você vê-la ronronando? – disse Tony.
– Mal posso esperar.
Ele viu Tony checando diversos programas, depois inicializando os
subcomandos que ativavam as respostas motoras da armadura.
– Desse jeito, ela se abre e espera que eu entre – disse Tony, os olhos ainda
fixos na tela. – Funciona muito melhor do que ter todas aquelas partes mecânicas
que precisam se conectar. Eu desenhei de modo que a rede de nanotubos se divida
ao longo de costuras, para se reconectar quando me detectar lá dentro. – Ele fez
uma pausa e arqueou a sobrancelha, fitando a tela do terminal. – Hum. Que
estranho.
– O quê?
– Parece que ela acha que eu já entrei – disse Tony. Ele olhou para Rhodey. –
Interessante acontecer isso justamente agora, quando estou lhe mostrando.
Então ele escancarou os olhos, e Rhodey viu a boca dele tentando pronunciar
seu nome, mas antes que o som pudesse chegar aos seus ouvidos o mundo
explodiu em chamas feito uma lâmpada estourando na cabeça dele.
  

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