HOMEM DE FERRO : VÍRUS
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E agora o corpo, a construção perfeita, a unificação final de técnica e soma. Eu sou
um homem, eu sou uma máquina. Sou uma força bruta com vontade invencível,
intelecto incomparável e força indomável. Na força de meus braços eu faço do
mundo objeto de minha vontade. Quebro o que não cede. Stark, em sua carapaça,
imagina-se equiparar-se a mim – mas você é um homem preso dentro de uma
máquina, enquanto eu sou um novo homem que ultrapassou os limites da sua
imaginação. Sou a Hidra, legado de visionários e inventores. Sou a expressão
emergente de um novo mundo, o avatar encarnado de uma humanidade que ainda
não existe. Em mim encontra-se a força do futuro, o poder latente da mente
esperando para ser acionado. Eu vi o que nenhum outro viu e criei o que nenhum
outro criou. Eu o fiz, Stark, e refiz, fiz uma versão melhor de você que espera
pacientemente pela morte de seu predecessor para aproximar-se do mundo de sua
inevitável perfeição. Você não pode me ouvir, mas não escutaria mesmo que
pudesse, e esse é o seu defeito. Esse orgulho! O que você fez para merecê-lo?
Quebrarei seus braços dentro de sua carapaça, esmagarei primeiro o seu espírito e
depois o seu corpo, para que sua morte seja o exemplo final para os idólatras da
máquina de que seu ídolo caiu.Mesmo com toda a informação que Tony podia acessar de imediato, de relatórios
sobre o clima no Saara a variações de largura de banda nos servidores das
Indústrias Stark, de dados climatológicos vindos de satélites a picos nas
instalações elétricas de New England, ele estava distraído e não previu o primeiro
soco pesado de Zola. Sem a armadura, o impacto teria feito um buraco no crânio
de Tony e arremessado seus olhos para fora das órbitas feito bolas de pinguepongue. Dentro dela, ele ficou meio zonzo e perdeu o equilíbrio.
Era sempre assim. Travava-se a guerra de informação, a guerra psicológica, a
guerra estratégica… no fim das contas, acabava tudo no mano a mano. Mesmo
quando as duas partes estavam envolvidas no que de melhor a tecnologia humana
podia oferecer. Tony devia ter contado com isso, devia ter planejado, mas andara
sonhando com algo diferente, esquecendo-se que a guerra sempre acabava numa
confusão, com a mão de um cara apertando o pescoço do outro.
Zola não se esquecera disso. Não era rápido como Tony, nem igualmente
equipado no que tange a incrementos eletrônicos, mas era imensamente forte.
Mais forte que Tony. Posso bloquear os poderes de controle mental dele, pensou
Tony. E posso defletir as armas de energia que ele usa, porque são a última geração
de coisas que eu projetei.
Mas não posso fazer nada quanto ao fato de que, sempre que chega perto de
mim, ele acaba comigo.
Tony o golpeou de volta, sem hesitar. E causou danos. O corpo de Zola
parecia ter sido projetado para absorver uma quantia infinita de punição. Livre
dos ditames da biologia, ele colocara todos os órgãos vitais bem lá embaixo, onde
Tony não os poderia alcançar. Geralmente, quando você acerta um cara na
cabeça, sacode o cérebro dele; faça isso um par de vezes e ele será derrubado.
Mas o cérebro de Zola não ficava na cabeça dele. Tony não sabia o que havia ali,
mas acertá-lo lá não parecia ter efeito algum.
– Não vai me derrotar lutando comigo como contra uma pessoa normal, Stark
– disse Zola, metendo outro cruzado de afundar o olho. – Sou o próximo estágio.
Sou tudo que aprendi, cada clone que já projetei, cada experimento que conduzi
só pra saber se daria certo. Você é como um Australopithecus enfrentando o
Homo sapiens; está perdendo não só em força física e tamanho, mas em força
mental também. E digo isso como alguém que respeita seu talento na área da
engenharia.Próxima tática, pensou Tony, e soltou uma rajada de haloalcanos líquidos, à
queima-roupa, nos olhos de Zola. Em seguida, deu um soco bem na ponte de seu
nariz, estilhaçando tanto o nariz quanto os olhos congelados, de cada lado. Zola
fez um barulho satisfatoriamente agoniado quando os pedaços de seu rosto
caíram e foram varridos pela turbulenta corrente de ar formada por seu voo.
– Essa é a hora em que o Australopithecus corre atrás do Homo sapiens com
uma pedra lascada – disse Tony. Sua cabeça ainda girava um pouco por causa dos
golpes de Zola, mas ele começava a recobrar o equilíbrio. – E não se esqueça: até
mesmo o Australopithecus fica irado quando sequestram a namorada dele.Ela é minha namorada?, pensou Tony. Não importava. Não tinha como não
aproveitar essa frase. Ele atirou raios de pulso em Zola, pensando que, cedo ou
tarde, teriam que fazer algum efeito.
• • • •
As Duas Madames traçaram uma fileira dupla de sangue e aço por entre a
unidade de Rhodey. Eram rápidas, muito mais rápidas do que deviam ser, e
quando atacavam, pareciam não errar jamais. A fumaça das granadas lançadas na
área de testes começara a se espalhar por todo o prédio, junto com o borrifar dos
chuveiros automáticos, aumentando a quase escuridão do corredor. Os comandos
da S.H.I.E.L.D. que poderiam ter atirado nelas pareciam não conseguir nunca
mirar corretamente; sempre havia um de seus colegas no caminho, geralmente no
momento em que morriam, e cada um dos homens que não arriscaram atirar se
perguntaria para o resto da vida se devia ter tentado. Mas eles não chegavam a
durar muito, porque as Duas Madames atacavam e sumiam.
Rhodey e seis homens assumiram posição atrás do balcão de recepção do
saguão frontal do Laboratório de ITR. As Duas Madames apareceram entre os
sete homens sem fazer ruído algum. Rhodey empurrou uma deles para o corredor.
– Vá avisar o Fury! – ele gritou. O homem saiu correndo.
Rhodey era um lutador habilidoso de artes marciais, e muito bom com
revólver e faca, mas não conseguia atirar porque as Madames estavam no meio
dos agentes, e ele não podia se aproximar porque, em combate próximo, as
chances aumentam se você usa uma arma em vez de uma faca. Apontou o rifle
para as duas mulheres, feliz por ter salvado um de seus homens, mas já sentindo a
periferia de seu campo de visão ficando vermelha com fúria atávica pela
iminência de perder os outros. Ele atirou, e errou. Atirou de novo, e errou. As
Madames foram para direções diferentes, e Rhodey soube que elas o pegariam.
Tudo o que ele podia fazer era escolher uma e tentar pegá-la antes que a outra o
pegasse. Girou para a esquerda, deitou os olhos nela – e depois viu o soldado que
enviara até Fury com a arma apontada acima do ombro direito dele. Ele desviou
no mesmo instante em que o soldado atirou, e meio segundo depois sentiu um
baque na cabeça, e o vermelho de sua visão ficou preto.
• • • •
– General! General! – disse uma voz queixosa e trêmula. Fury não a
reconheceu.
– Fury – disse ele.
– General, Rhodey caiu. Rhodey caiu, tem essas duas mulheres com espadas…
A transmissão foi cortada. Fury passou para o canal direto com Rhodey.
– Rhodey. Informe – disse.
Sem resposta.Mulheres com espadas?, pensou Fury. O que viria depois? Ele já
tinha que lidar com uma porção de clones. Eles haviam aberto uma entrada para a
área de testes, entre uma furadeira simples e uma minissala acoplada onde Tony
projetava circuitos e algo que ele chamava de reservatório cinético. Quatro clones
de Hogan apareceram atrás das portas de aço brilhante da sala, criando um
tiroteio cruzado absurdo com outros clones que atiravam no restante da área de
testes, escondidos atrás da picape incendiada.
Mas isso era tudo que restara da Hidra. Fury achou que a S.H.I.E.L.D. havia
vencido. Os clones de Hogan lutariam até a morte porque era isso que faziam,
mas estava em número suficiente para arrancar fora do laboratório os agentes de
Fury.Daqui a pouco vamos poder avançar e dar cabo deles de uma vez por todas,
pensou. Ele contava com 21 soldados em bom estado, mais Pepper, mais os
soldados de Rhodey que sobreviveram…
Pensar em Rhodey o distraiu. Mulheres com espadas?
Ele atirou contra os Hogans na sala e olhou para a entrada do corredor,
pensando que seria melhor tentar achar o agente de Rhodey, já que a
comunicação parecia estar comprometida. Foi então que viu uma das mulheres
com espadas.
Era Madame Hidra. Já a conhecia, já lidara com ela, já perdera homens para
ela – e um mês antes, vira fotos de sua autópsia tiradas após a colisão aérea que
a matara junto com outras 94 pessoas. Pelo visto, Zola tinha mais uma carta para
jogar.
Depois a segunda Madame Hidra apareceu e ambas entraram em ação. A
primeira foi escorregando pela parede da área de testes, escondendo-se atrás do
maquinário, de modo que Fury não conseguia mirá-la. Alcançou dois dos homens
dele e os surpreendeu, matando-os antes que os disparos de Fury derrubassem as
máquinas que ela usara como defesa. Do canto dos olhos, ele viu a segunda saltar
por cima do corrimão que separava a área do terminal de controle do piso
principal, alçando voo num salto que a colocaria bem na frente dele. Ele girou o
rifle, mas soube que seria tarde demais.
Uma rodada de tiros vinda do outro canto da sala a rasgou toda, e o salto
terminou numa queda graciosa. Ela caiu no deque, perto de Fury, e ficou por ali.
Ele olhou para a outra Madame. Com um grito coletivo, os Hogans remanescentes
invadiram o recinto, energizados pela chegada dos clones da antiga líder da
Hidra.
Fury derrubou um deles com uma rodada tripla de disparo típica, depois
preparou-se para dar cabo de um par de Hogans que já estavam na plataforma do
terminal de controle. Atrás deles, um comando da S.H.I.E.L.D. levantou-se e
atirou, matando um. Fury baleou a cabeça do segundo, e reprimiu um tremor ao
ver o ferimento no rosto daquele Happy Hogan… foi quando a Madame que
estava no chão puxou-lhe o pé e girou para ficar em cima dele. Ele acabou
soltando o rifle, e quase não conseguiu tirar a cabeça do caminho do primeiro
golpe. Em vez de perfurar seu olho bom, a lâmina cortou um pedaço da orelha e
abriu um talho na lateral da cabeça. Ele a pegou pelo pulso, mas ela se sacudiu
feito uma criança para se libertar, metendo os dedos duros da outra mão na
garganta dele.
A visão do general ficou turva. Girou às cegas e sentiu o impacto do punho,
mas não exerceu força suficiente para derrubá-la de cima dele, e não via a faca
em lugar algum. Virou a cabeça e os ombros para a direção oposta da qual supôs
que viria o golpe seguinte, mas, em vez de uma faca na garganta, Fury sentiu o
corpo da Madame chacoalhar ao mesmo tempo em que ouviu um disparo de rifle
vindo de algum lugar da sala. Ela caiu de cima dele, que procurou o rifle,
registrando que as balas que o salvaram haviam partido de ninguém menos que
Pepper Potts.
– Até que enfim fiz outra coisa além de brigar com computadores.
O comando da S.H.I.E.L.D. que matara o primeiro dos Hogans estava morto,
com uma faca enfiada embaixo do maxilar. Fury nem vira a Madame atirar a
arma.
– Belo disparo, Pepper. Agradeço.
Ela deu de ombros.
– Não tinha como errar daqui. Desculpe pela sujeira.
Fury estava coberto pelo sangue do clone, e uma boa quantidade do seu
próprio vazava pela cabeça.
– Faz parte – disse ele, e foi juntar-se à batalha que ainda acontecia.
Não havia muito mais o que fazer. O ataque dos Hogans foi puro desespero,
e assim que perderam a organização do cerco, as forças bem treinadas da
S.H.I.E.L.D. os rasgaram ao meio sem cerimônia. Os comandos passavam clone
por clone, checando para ver se estavam mesmo mortos ou para chamar um
médico. Fury ficou um pouco chateado por ver que alguns dos Hogans estavam
vivos, não por não achar que não mereciam viver, mas porque não conseguia
imaginar que tipo de vida eles teriam após a Hidra. Certas coisas eram piores que
a morte. Happy tinha razão nesse ponto.
E, por falar nele, onde se metera? Assim que encontrassem e dessem fim na
outra Madame, encontrá-lo seria a prioridade. A não ser que Tony voltasse a
entrar em contato antes disso.
– S.H.I.E.L.D. – ele chamou. – Existe mais um clone de Madame Hidra em
algum lugar nestas instalações. Precisamos encontrá-la e eliminá-la. Mexam-se.
Os comandos reuniram-se em equipes de quatro homens e começaram a
dividir o território sob a luz fraca da área de testes. Conforme procuravam, mais
tiros ecoaram no fim do corredor, na entrada do prédio.
– Fiquem atentos, pessoal – disse Fury. Ele se perguntou se esse barulho
seriam os soldados de Rhodey confrontando Hogans remanescentes. Parecia ser a
única possibilidade. Ele clicou no canal de Rhodey novamente. – Informe, soldado
– disse. – Está perdendo o fim da festa.
Sem resposta.
– Fique firme aí – disse Fury. Ele apontou para uma das equipes de busca. –
Vocês, comigo. Vamos checar a unidade de Rhodey. Algum de vocês é médico? –
Um dos agentes ergueu a mão. – Ótimo. Vamos.
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