BUOPÉ, O NOBRE GUERREIRO
(SAGA DOS TÁRIAS – IV)
A extraordinária saga dos índios tárias chega, agora, ao seu vibrante
desfecho. Desta feita ficaremos sabendo como nossos ancestrais tornaram-se
grandes conquistadores.
O chefe da primeira expedição náutica dos tárias chamava-se
originalmente Ucaiari, passando depois a ser conhecido por Buopé. Ele era um
tuixaua, título supremo de um chefe tária, e havia chegado com seus homens
numa jangada após navegar sem rumo pelo rio Negro.
Ao colocar os pés em terra, o nobre guerreiro decidira se estabelecer ali.
– Voltar como, se nem sabemos para que lado seguir? – dissera ele aos
companheiros.
Convicto disso, o chefe indígena mandou, então, construir uma aldeia e se
autoproclamou senhor absoluto da terra, pois assim se fazia em toda parte nos
dias antigos.
Em três luas, a nova aldeia estava pronta.
Mas não demorou muito e um dos tárias trouxe ao chefe esta péssima
notícia:
– Grande tuixaua, encontrei rastros de pés humanos próximos da aldeia!
Imediatamente nasceu no peito de Buopé a certeza de que estavam sendo
vigiados.
– Vamos, então, espionar os espiões! – disse ele, tomando o seu tacape.
Buopé não queria saber de ninguém mais em seus domínios, mesmo que já
estivessem ali muito antes dele. Aquela terra, agora, pertencia aos filhos do
Sangue do Céu.
Após certificar-se de que as pegadas pertenciam aos membros de uma
tribo vizinha, Buopé reuniu rapidamente os seus homens.
– Alegrem-se, teremos guerra! – anunciou ele, e todos puseram-se a
confeccionar grandes quantidades de tacapes, arcos, flechas, fundas e o restante
de armas então usadas pelos índios.
Uma lua depois, os tárias guerrearam contra os seus inimigos nativos,
derrotando-os fragorosamente. Além de conquistarem mais uma boa porção de
território, os filhos do Trovão conquistaram também uma porção de mulheres da
tribo vencida.
– Agora, já podemos multiplicar o número de tárias! – disse Buopé, em
júbilo.
Três anos transcorreram até que Buopé e os seus valorosos guerreiros
pudessem entender a língua daquelas mulheres. Quando isso finalmente
aconteceu, eles descobriram que outra porção da gente delas vivia num lugar não
muito distante dali.
– Levem-nos até lá! – ordenou o tuixaua às mulheres.
Imediatamente, foi organizada uma nova expedição de conquista. Quando
“fez mão de lua”, ou seja, dentro de cinco luas, Buopé e os seus chegaram ao
lugar.
A batalha durou três dias, e ao cabo dela Buopé era, de novo, o vencedor.
– Mais ventres para espalhar a nossa raça! – disse o chefe guerreiro,
tomando para si outra vez as mulheres dos inimigos mortos.
E assim o chefe tária foi conquistando todos os povos às margens do rio
Negro, até tornar-se senhor absoluto da região. Quando seus filhos ficaram
adultos, mandou-os irem guerrear contra as tribos de canibais acima e abaixo do
rio.
Buopé tinha o costume de, após matar os seus inimigos, ir até as margens
do rio e cuspir dentro de um funil de folha. Depois, lançava-o correnteza abaixo,
a fim de chamar magicamente a sua gente distante.
Então, os anos se passaram e ele envelheceu, perdendo finalmente as
forças. Uma noite, a Mãe do Sono lhe apareceu outra vez e o fez sonhar que tinha
morrido. Buopé viu, por entre as névoas do sonho, que o seu corpo já não fazia
mais sombra e que, ao redor dele, todos choravam.
Era o aviso do fim.
O nobre tuixaua reuniu seus filhos, deu-lhes as últimas instruções e, quando
o sol surgiu, um beija-flor saiu de dentro do seu peito e disparou em direção ao
céu.
O corpo de Buopé foi enterrado numa gruta secreta, cuja localização
permanece ignorada. Descendente algum recebeu autorização de ostentar o seu
nome glorioso, e todo aquele que pretendeu utilizá-lo, mesmo sob formas
disfarçadas e ridículas, sofreu a maldição implacável de tornar-se, por todos os
dias da sua vida, um pobre-diabo fracassado e rosnador de maledicências.
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