BRADADOR
O Bradador pertence à mesma espécie quase abstrata do Alma-de-Gato ou
do Pé de garrafa, sendo conhecido apenas pela verdadeira paixão que nutre pelo
escândalo.
De fato, nenhuma outra criatura do nosso folclore personifica melhor esse
traço espalhafatoso dos nossos entes sobrenaturais do que esse personagem
habitante do Centro-Sul do Brasil.
Espécie anômala de assombração – já que, segundo a boa doutrina, não se
trata de um fantasma –, o Bradador, mesmo assim, costuma fazer suas aparições
à meia-noite em ponto de todas as sextas-feiras. Só que, em vez de arrastar-se
em silêncio, prefere lançar-se numa correria desatinada, ao mesmo tempo em
que berra feito um doido varrido.
Desde o instante em que o Bradador começa a sua ronda histérica, criatura
nenhuma consegue mais dormir, gente ou animal, devido à estridência dos seus
gritos.
A questão de o Bradador ser ou não uma alma penada parece estar
resolvida a partir do momento em que se busca a sua origem. Segundo a maioria
dos estudiosos, o Bradador origina-se, em regra, do corpo mumificado de algum
cadáver incorrupto, sendo, por isto mesmo, chamado também de “corpo-seco”.
Tratar-se-ia, pois, de um corpo andante, como os zumbis haitianos ou as múmias
egípcias, e não de uma alma penada, que é um ser sutil e incorpóreo.
O folclorista paranaense Francisco Leite afirma ter visto, em sua
juventude, uma dessas múmias desenterrada e encostada num pé de imbuia, “a
completar o seu fado material sobre o solo”. (Se viu mesmo, deve ter sido
durante o dia, enquanto ela dormia, pois é consenso absoluto entre os estudiosos
que a simples visão do Bradador acarreta a morte imediata do enxerido.)
A exemplo da Cabra-Cabriola, este mito parece também ter sido
importado, embora seja difícil imaginar um lugar da Terra onde não possa
vicejar, espontaneamente, um parente qualquer da espécie. Em Portugal, por
exemplo, existe uma versão feminina do nosso Bradador, a Zorra Berradeira,
uma criatura possivelmente dez vezes mais escandalosa. No Vale do São
Francisco, temos o Gritador.
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